Você já passou pela experiência de colocar um som para relaxar, depois
de um dia difícil? Ou de tocar uma música agitada ao chegar na academia,
na tentativa de aumentar o pique? Se já fez isso é porque percebeu que
os acordes são capazes de afetar as suas emoções.
Partindo
dessa mesma premissa, surgiu a musicoterapia, cujo objetivo é pesquisar a
relação do homem com os sons, para transformar esse conhecimento em
métodos terapêuticos. "Já sabemos que a atividade musical envolve quase
todas as regiões do cérebro", explica a musicoterapeuta Maristela Smith,
fundadora e coordenadora da área de musicoterapia do Instituto de
Medicina Física e Reabilitação do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da USP (Universidade de São Paulo).
Quando uma música
emociona, por exemplo, a estrutura do cerebelo --que modula a produção e
a liberação dos neurotransmissores dopamina e noradrenalina-- é
ativada, assim como a amígdala cerebelosa, a principal área do
processamento emocional no córtex cerebral. Já quando acompanhamos uma
canção, acessamos o hipocampo, responsável pelas memórias.
Por
isso mesmo, a música é capaz de influenciar não só o estado mental como
também o físico. "O corpo tem uma tendência a seguir o ritmo ouvido,
tanto em sua velocidade, quanto em sua altura e intensidade", diz
Maristela. Consequentemente, os sons podem afetar as frequências
cardíaca e respiratória, a pressão arterial, a contração muscular e até o
ritmo do metabolismo. "Eles também podem ajudar a intensificar e a
reduzir os estímulos sensoriais, como a dor", explica a musicoterapeuta.
No combate ao câncer, por exemplo, o método já vem sendo utilizado, com
bons resultados. "Nesse caso, a musicoterapia, além de trabalhar
funções emocionais presentes, como a redução do estresse e da ansiedade,
também contribui para o aumento dos circuitos neurais responsáveis pela
diminuição da dor crônica", declara Maristela.
Na Oncologia
Pediátrica do Hospital da Criança Conceição e no Hospital São Lucas da
PUC- RS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul), o
trabalho com música rendeu uma melhoria de 74,8% no estado de ânimo das
crianças hospitalizadas.
"A música tem um enorme potencial sobre o cérebro humano,
principalmente no que diz respeito ao sistema límbico, o centro de
sentimento e emoções do cérebro, e ao resgate da memória", diz a
musicoterapeuta Maria Helena Rockenbach, que conduziu a pesquisa.
De acordo com o musicoterapeuta David Maldonado, que se especializou em
intervenções musicais em neuropediatria pela Ufscar (Universidade
Federal de São Carlos), os sons também podem contribuir para fortalecer o
sistema imunológico.
"A música envolve a capacidade mental,
emocional, física, social e fisiológica. Por isso, podemos recomendar a
musicoterapia como coadjuvante no tratamento de quase todas as doenças",
diz.
Identidade sonora
No cérebro, a capacidade de
uma determinada música atingir uma região ou outra está vinculada com o
maior ou menor prazer da audição. Por isso, antes de iniciar um processo
de musicoterapia, é importante traçar a Identidade Sonora do Indivíduo,
também chamada de ISO.
"Cada pessoa tem um conjunto de sons e
músicas que contam sua história, que fazem parte da sua vida. Esse
conjunto é único, é como uma impressão digital. Na musicoterapia,
acessamos elementos dessa identidade para resgatar situações vividas,
desenvolver potenciais e dar novos significado a determinados
conteúdos", explica a musicoterapeuta Luciana Frias, responsável pela
implantação da Musicoterapia no IMIP (Instituto de Medicina Integral de
Pernambuco).
Essa investigação considera a música no contexto geral de vida do
indivíduo e não apenas os sons que o agradam naquele momento. "A
identidade sonora está intimamente ligada à história de vida, uma vez
que a música perpassa toda a trajetória do ser, desde a vivência
intrauterina até o seu momento final", afirma Maristela.
Nessa
pesquisa, os especialistas chegam às músicas capazes de despertar
sentimentos positivos e negativos no indivíduo e, durante o tratamento,
vão utilizar esses dados conforme a necessidade.
"Pacientes
epilépticos são capazes de entrar em crise se ouvirem determinados sons,
assim como pacientes depressivos ou eufóricos podem agravar o quadro
dependendo da música que lhes chega aos ouvidos. Por isso é tão
importante que o tratamento seja sempre feito por um musicoterapeuta", explica Maristela Smith.
matéria publicada por Marina Oliveira e Thaís Macena
Do UOL, em São Paulo 17/02/2014
Do UOL, em São Paulo 17/02/2014